Congresso Abradt homenageia Prof. Sacha Calmon

Congresso Abradt homenageia Prof. Sacha Calmon

Painel de Homenagem: Alberto Guimarães (procurador do estado de Minas Gerais), Sacha Calmon (homenageado), Carlos Mário da Silva Velloso (ex-Ministro aposentado do STF), Valter Lobato (presidente da Abradt), Assusete Magalhães (Ministra STJ), José de Castro Meira (ex-Ministro aposentado do STJ), Janir de Adir Moreira (advogado e diretor da Abradt)


O XXII Congresso Internacional de Direito Tributário da Abradt, realizado em Belo Horizonte, entre os dias 19 e 21 de setembro, contou com as maiores autoridades do Direito Tributário. A composição das 20 mesas e as visões profundas e plurais dos 80 palestrantes, fizerem desta edição um grandioso evento.

Um dos grandes momentos do Congresso Abradt 2018 foi a homenagem recheada de emoção e alegria que o Procurador do Estado de Minas Gerais, Alberto Guimarães, fez ao nosso presidente honorário, professor Sacha Calmon. “Ele colocou os corações de todos os alunos, amigos e familiares em seu discurso. Suas palavras e seus gestos nos representaram tanto que somente posso agradecer a justa e feliz escolha”, ressalta o presidente da Abradt, Valter Lobato.
Leia-o na íntegra:
Senhoras e Senhores,
Quero contar-lhes, de forma breve, uma bonita história em parte conhecida pelos senhores.
Nos idos de 1930, o engenheiro Josias Coelho Júnior nascido na histórica Juazeiro no Estado da Bahia, com residência já fixada na cidade de São Salvador, enamorou-se de uma distinta dama da família CALMON NAVARRO e com ela se casou, criando assim a família Calmon Navarro Coelho.
Dessa união, em 15 de junho de 1940, nasceu o primogênito da família que se tornaria uma pessoa conhecida e respeitada em todo Brasil, a começar pelo nome – SACHA – pouco usual entre os soteropolitanos que fizeram de São Salvador uma das grandes metrópoles brasileiras.
Menino inquieto, curioso das coisas e das pessoas, que nunca soube nem quis resistir aos apelos das ruas e das gentes, ia sempre a elas para conhecer e crescer.
O pai, engenheiro da Rede Ferroviária Federal, era chamado a trabalhar em lugares diferentes, morando aqui e acolá, e assim carregava o menino para lugares e vidas novas.
Ante a precisão de bem educar aquele moleque faceiro acabou por concordar em deixá-lo em Salvador, aos cuidados do Tio Tancredo Teixeira, e veio parar nas Minas Gerais, mais precisamente na cidade de Teófilo Otoni.
Na agitada Salvador da década de 1950, o chamado das ruas era irresistível para o adolescente SACHA, que nelas encontrava deleite para suas aventuras e campo para vivenciar de tudo.
O velho BIMBA foi seu mestre na capoeira, com quem aprendeu as gingas do corpo, e a noite seu manto de aventuras e descobertas. Assim, na aprazível Salvador, a vida seguia mansa e agradável.
Mas, chegava a hora de ele assumir novas reponsabilidades, escolher a faculdade e uma profissão a abraçar. Ainda trabalhando em Minas, o pai zeloso, ocupado com seu futuro, resolveu trazê-lo para a jovem capital dos mineiros, onde iniciaria seus estudos jurídicos.
Não teve dificuldade de ingressar na Faculdade Mineira de Direito da UCMG. Nela entregou-se aos estudos e à vida acadêmica que acabou levando-o para a militância política.
Jovem idealista e ativo participou dos movimentos que se seguiram à renúncia do Presidente Jânio Quadros e da tumultuada posse de Jango. Viu a exacerbação dos comunistas e a explosão da revolução do 31 de março de 1964, que o encontrou na linha de frente dos protestos estudantis.
Suas ações e pregações foram consideradas subversivas para a nova administração castrense que se instalara no País, vindo a ser preso, indiciado em inquérito policial-militar, do qual se livraria graças a habeas corpus que o então jovem acadêmico manu propria impetrara.
No ano seguinte, 1965, bacharelou-se em Direito e casou-se com Maria da Glória Junqueira, a sua querida Glorinha. Sem raízes fortes entre os mineiros, teve que se reinventar para cuidar da família recém-constituída.
A fama haurida nos tempos agitados da universidade, de ações estudantis e memoráveis pelejas políticas, dificultaram o início de sua vida profissional. Poucas portas estavam abertas e muitos eram os obstáculos no mercado de trabalho. Mas, este persistente baiano, forjado na tempera do bom aço, foi em frente, perseverou e saiu-se vitorioso.
Começou a exercer a advocacia na Comarca de Nova Era e arrabaldes. Depois, aprovado em duro concurso público, tornou-se auditor da receita estadual e assessor do então secretário da Fazenda, Fernando Roquete Reis. Assumiu a chefia da Procuradoria Fiscal do Estado e em 1981 concluiu seu doutoramento.
Teve uma profícua vida acadêmica como professor na PUC e na UFMG, e depois como Titular de Direito Financeiro e Tributário, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), cidade onde dividiu residência com Belo Horizonte.
Mas foi além: tornou-se juiz federal após conquistar o primeiro lugar no concurso nacional de 1987, tendo exercido a judicatura no Rio de Janeiro e, depois, em Belo Horizonte, com denodo e brilhantismo.
Seus horizontes, porém, seriam ainda maiores, e, em 1994, ele deixa a magistratura para dedicar-se à advocacia, tornando-se um dos mais respeitados juristas brasileiros, com banca de excelência formada com a notável colega Mizabel Derzi.
Além de suas inúmeras conquistas profissionais, SACHA, na verdade, sempre acreditou nos homens e sabia que na união e conjunção de esforços encontraria mais progresso e satisfação.
Juntou-se a homens de bem mais que de posses, apostou na inteligência mais que no poder e obteve sucesso ajudando e sendo ajudado, pois soube dar as mãos aos mais necessitados.
O Professor doutor Sacha Calmon é um prodígio na arte de escrever. Em sua fecunda carreira acadêmica produziu incontáveis peças jurídicas de relevância e  teve cerca de 200 artigos e capítulos de livros publicados no Brasil e no exterior, além de inúmeras obras jurídicas de alcance nacional, das quais destaco:

  • Curso de Direito Tributário Brasileiro – Teoria e Prática das Multas Fiscais;
  • O controle da constitucionalidade das Leis e do Poder de Tributar na Constituição de 1988;
  • Liminares e Depósitos antes do lançamento por homologação: Decadência e Prescição;
  • Contribuições ao Direito Brasileiro;
  • Teoria Geral do Tributo, da Interpretação e da Exoneração na Tributação;
  • Evasão e Elisão Fiscal. O Parágrafo Único do Art. 116, CTN, e o Direito Comparado.

Em co-autoria com a sócia Misabel Derzi:

  • Interpretação no Direito Tributário;
  • Imposto de Renda – Estudos;
  • Direito Tributário Aplicado;
  • Direito Tributário Contemporâneo;
  • Direito Tributário Interdisciplinar;
  • Direito Tributário Atual – Pareceres;
  • O Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial (IPTU);
  • Contribuições para a Seguridade Social – Coordenador;
  • O Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana.

Além da densa literatura jurídica, SACHA produziu preciosidades no campo histórico-filosófico, como a “História da Mitologia Judaico-Cristã”, na qual apresenta interpretações de mais de 40 autores sobre o surgimento e desenvolvimento das religiões reveladas (judaísmo, cristianismo e islamismo); lançou, depois, a “Breve História do Mal“, sobre a teoria da culpa e o chamado pecado original, onde contrapõe a explicação antropológica à dos princípios metafísicos. Por último, ainda publicou “A Invenção do Monoteísmo”, dedicada ao saudoso pai que o iniciara no fascinante universo da mitologia bíblica.
O incomparável Jorge Luiz Borges, um dos maiores escritores do século XX, ao fim de sua vida, com indizível humildade, afirmou que se orgulhava mais do que havia lido do que o que havia escrito.
Poucos são os homens que podem ter semelhante orgulho e SACHA certamente é um deles.
Escreveu muito e bem, mas, sempre se dedicou ao estudo e à leitura do que melhor produziu a humanidade, e nisso hauriu o denso e profundo conhecimento que generosamente reparte com seus alunos e leitores.
Nunca se calou nem buscou o conforto do silêncio obsequioso. Ao revés, usa sua boa pena na crítica aos que lidam de forma ineficiente ou prejudicial aos destinos do País, clareando a todos o bom caminho.
Aprendeu ele que a tirania, a corrupção e a vilania se combatem com gestos, palavras e ações cívicas, e que não há de se arrefecer a luta contra as ignomínias perpetradas pelos maus.
Incansável, produz ainda hoje imperdível página semanal no grande jornal dos mineiros, o “Estado de Minas”, onde não se furta de comentar e criticar temas hodiernos, sem compromisso de bajular ou medo de desagradar.
Assim, é SACHA: alargou seus conhecimentos e os distribuiu generosamente, em perfeita comunhão à reflexão poética feita pela inesquecível CORA CORALINA:
“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
O saber se aprende com mestres e livros.
A Sabedoria, com o corriqueiro, com a vida e com os humildes.
O que importa na vida não é o ponto de partida, mas a caminhada.
Caminhando e semeando, sempre se terá o que colher.”
Preocupado com o futuro do país e desapontado com os rumos da nossa república, intentou seu retorno à política, como fez com tanta coragem e ousadia na juventude, mas, a família lhe pediu comedimento, e ele acabou recusando postular um lugar no parlamento.
Pai de cinco filhos, cinco netos e uma bisneta, profissional modelar, acadêmico e professor ímpar, fez de sua vida um exemplo de tenacidade e boa luta, que serviu e há de servir de norte e luz para as novas gerações.
Suas pegadas fundas foram cravadas em terras baianas e mineiras, e deram-lhe o reconhecimento de todos os brasileiros, tornando-o merecedor das justas homenagens que ora se lhe prestam.
Francisco Otaviano, poeta singular, parodiava que:
“Quem passou pela vida em brancas nuvens,
E em plácido repouso adormeceu.
Quem não sentiu o frio da desgraça.
Quem passou pela vida e não sofreu.
Foi espectro de homem, não foi homem.
Só passou pela vida, não viveu”.
Assim é você, caro amigo e professor SACHA: viveu e vive ainda intensamente, aprendeu e ensinou e partilha generosamente com todos seus vastos conhecimentos.
Finalmente, permito-me lembrar o maior poeta da língua portuguesa, Fernando Pessoa:
“O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.”
E você, caro Professor SACHA, é mesmo assim: INCOMPARÁVEL!
Muito obrigado!
Alberto
O grande Carlos Drummond de Andrade, em sua inolvidável apologia ao poder das mãos que se entrelaçam, nos legou precioso poema oportuno ao momento:
MÃOS DADAS
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos, mas, nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher,
de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer,
a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes
ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas
nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria,
o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.

B.Hte. – 21.set.2018
Auditório do Mercure Aparthotel – Av. Contorno,
Congresso Internacional de Direito Tributário / ABRADT
Homenagem ao Prof. SACHA CALMON NAVARRO COELHO

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