No último dia 17, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a proibição da cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) pelo estado a partir de onde se realiza a compra de produtos a distância. A decisão foi apenas o capítulo mais recente de um embate tributário que pode vir a ser solucionado por meio de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) já aprovada no Senado. A polêmica tem a ver com a indefinição a respeito da cobrança do ICMS em casos de compra interestadual não-presencial, ou seja, feitas pela internet, telefone ou até mesmo correio. De acordo com as regras atuais, o estado onde está o comprador – estado de destino – não tem direito a nenhuma parcela da arrecadação do ICMS sobre o produto adquirido. O estado onde está sediada a empresa – estado de origem – fica com toda a arrecadação.
A PEC 103/2011, do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), determina que, nos casos das compras não presenciais, o ICMS seja dividido entre os dois estados envolvidos – o de origem e o de destino. Relatada favoravelmente por Renan Calheiros (PMDB-AL), a proposta foi aprovada pelo Plenário do Senado em 2012 e remetida à Câmara dos Deputados.
A divisão do ICMS seria feita a partir da diferença entre a alíquota interestadual do imposto (definida pelo Senado e atualmente em 12%) e a alíquota interna de um dos estados envolvidos, dependendo do caso. Se o comprador for uma empresa, considera-se a alíquota do estado comprador; se for uma pessoa física, a do estado vendedor.
José Patrocínio da Silveira, consultor legislativo do Senado especialista na área tributária, explica que essa divisão não burocratizará nem dificultará o comércio virtual, pois a comunicação entre os estados para assuntos tributários não é difícil.
– Com a Nota Fiscal Eletrônica, os estados e até a Receita Federal tomam conhecimento imediato. Operacionalmente, não há dificuldade nenhuma – tranquiliza ele.
A realidade atual, sem regras definidas, prejudica a maioria dos estados brasileiros, segundo Patrocínio.
– São poucos os estados do Brasil que têm superávit nesse tipo de comércio, ou seja, que vendem mais do que adquirem – explica ele.
CONCENTRAÇÃO DE EMPRESAS
Os estados mais populosos e ricos tendem a abrigar mais empresas que atuam no setor. Assim, concentram também a arrecadação. O prejuízo é dos estados que não servem de base para as lojas virtuais. Seus habitantes continuam comprando, mas eles não se beneficiam com o imposto sobre esses gastos, o que é criticado pelo senador Walter Pinheiro (PT-BA).
– Não tenho que colocar lá no cafundó da Bahia a mesma loja que está bem instalada em São Paulo. É natural que um estado com maior demanda de consumo atraia as lojas, mas não se pode punir os outros estados por causa disso. Até porque eles também contribuem com o consumo – alerta.
O senador, defensor da PEC 103/2011, afirma que o critério atual para a cobrança do ICMS no comércio não presencial é o “mais desonesto”.
– Não é possível tratar essa questão assim. O sujeito gasta o dinheirinho dele aqui [no estado comprador] e o estado não ganha nada? Isso arrebenta a economia local – critica Pinheiro. Ele calcula que somente seu estado, a Bahia, deverá perder R$ 400 milhões em 2014 devido à inexistência de uma divisão mais justa.
O senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) também apoia a proposta aprovada pelo senado. Para ele, os estados que não abrigam os centros de compras virtuais estão sendo penalizados.
– Os grandes estados estão se apropriando de algo que não é deles, que é o ICMS gerado pelos compradores – questiona. Flexa conta que até mesmo seus colegas das unidades da federação beneficiadas pelo modelo atual entenderam que é preciso dividir a arrecadação. Assim saiu o acordo que permitiu a aprovação da PEC no Senado há dois anos.
TRAMITAÇÃO NA CÂMARA
Na Câmara, onde tramita como PEC 197/2012, a proposta já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e em comissão especial, mas desde abril aguarda votação no Plenário. Para ser aprovada definitivamente ela precisa passar com sucesso por duas votações, obtendo em cada uma o mínimo de 308 votos favoráveis – o equivalente a três quintos da composição da Câmara. Porém, se sofrer modificação na Câmara, voltará ao Senado.
Para Pinheiro, questões de natureza tributária nem deveriam passar pela Câmara. O ideal, para o senador, seria que somente o Senado decidisse sobre o assunto.
– Defendo que determinadas matérias só deveriam ser apreciadas pelo Senado. Esse assunto tem tudo a ver com os interesses das unidades da federação, dos estados. Defender esses interesses é a nossa tarefa.
Flexa acredita que a retomada dos trabalhos do Congresso após as eleições permitirá uma rápida aprovação da PEC. Para ele, é preciso também usá-la como ponto de partida para um debate mais amplo.
– O ideal é agregar essa questão com a revisão do indexador das dívidas dos estados e municípios. Lamentavelmente, o governo se omite, não senta à mesa para negociar e deixa uma briga fratricida entre os estados – avalia.
Walter Pinheiro também vê a PEC como um primeiro passo. Para ele, é a oportunidade de dar início gradual à reforma tributária.
– É um começo. Essa reforma tem que ser feita por partes. Você vê onde tem uma anomalia e ajusta as condições ali. Depois, parte para outra – defende.
Fonte: Agência Senado